Nossa parte na barbárie...


NOSSA PARTE NA BARBÁRIE




Por Paulo da Vida Athos


Quando os policiais civis Fernando Guilherme Medeiros Queiroz e Luiz Hermes Ferraz Dantas saíram de suas casas para trabalhar em nosso nome, na terça feira passada, dia 27 de dezembro de 2005, não sabiam que perderiam a vida naquela manhã. Ambos foram cruel e covardemente assassinados por um bando que, armado de fuzis e pistolas, “tentavam resgatar um preso na porta do Fórum da Ilha do Governador”, segundo as autoridades. Como de praxe, no discurso de sempre quando nossos policiais são covardemente assassinados, o ilustre secretário de Segurança, Marcelo Itagiba, disse que houve falha na escolta dos presos e determinou ao chefe de Polícia Civil, Álvaro Lins, que fosse aberta uma sindicância para apurar o caso. Ou seja, como de hábito deixam a casa cair para depois levantar, quando o óbvio seria não permitir sua queda. Ao final, o blá blá blá de sempre. O inquérito? Vai redundar em nada!

E por qual razão vai redundar em nada? Não se pune mortos e a responsabilidade administrativa será lançada na conta dos policiais sacrificados, que serão considerados “negligentes” ou “imperitos” na condução da escolta que acabou por ceifar-lhes a vida e, saindo pela tangente, os maiores responsáveis, quem deu a ordem e o Governo do Estado, vão ver o foguetório na Avenida Atlântica, pois afinal é fim-de-ano e ninguém é de ferro. Antes fosse. Se de ferro, Fernando e Luiz Hermes estariam vivos.

Isso é a demonstração mais acachapante do despreparo de nossos agentes e da incapacidade plena de nossa política de segurança pública. Nossos policiais civis e militares estão sendo caçados, senhores! Mas não é de hoje! Nos últimos seis, sete anos, a caça virou caçador na selva em que deixaram a cidade do Rio de Janeiro, e sua região metropolitana, se transformar. Não me venham de forma a subestimar a inteligência do povo afirmar que vão apurar, abrir sindicância, inquéritos, e toda aquela baboseira de sempre que, sabemos todos, é conversa fiada pura e torpe.

A segurança pública se faz com gente preparada e equipada. E quem está assim: são os bandidos. E todos sabem!

As verbas que deveriam ser aplicadas de forma integral em nossa segurança pública, que ainda é insuficiente, têm sido desviadas de forma absurda para programas que nada tem a ver com ela! Que visam às próximas eleições em que Fernando e Luiz não mais poderão votar.

O preso que seria resgatado era Marcélio de Souza Andrade, que seria um dos chefes do tráfico do Morro do Juramento, em Vicente de Carvalho, que fora preso no dia 8 de dezembro e ia ser ouvido no processo que investiga os assassinatos de dois PMs e dois vigilantes da Fiocruz em maio do ano passado. Um homem desses não poderia sair como um zé mané qualquer. Tinha que ter escolta preparada, do CORE, do BOPE, do SOE ou de todos esses órgãos juntos. O cara era bicho solto. Era...

Não poderemos nem mesmo saber a verdade inteira. Quem mandou, quem articulou como chegar aos demais membros do bando. Nossos despreparados policiais, revoltados justificadamente, não queriam prender ninguém: queriam caçar. Queriam a vingança e a conseguiram. Com isso não há investigação a fazer.

Por que falo que foi uma caçada? Simples. Segundo o comandante do 17º BPM (Ilha), tenente-coronel Roberto Alves de Lima, 50 policiais civis e militares e 30 soldados da Aeronáutica participaram da caçada aos fugitivos. Às 14h, receberam auxílio de cães farejadores da polícia e da Aeronáutica. 

Segundo o comandante, Marcélio e um outro bandido, não identificado, foram encontrados mortos na área militar. Com eles foi achado um fuzil HK, além do fuzil e das pistolas dos policiais mortos. Os outros dois criminosos - que não tiveram os nomes informados pela polícia - foram capturados só à noite, pulando o muro para deixar a área militar. Um deles será apresentado na Polinter nesta quarta-feira. O outro não poderá ser apresentando à imprensa por ser menor de idade. 

Fora “encontrados mortos” uma ova, foram mortos por burrice e despreparo. O pior é que se o tal Marcélio abre o bico, muita coisa poderia ser esclarecida. Mas agora é tarde, Inês é morta. Inês, não: Marcélio. Se levado a interrogatório e se abre o bico, muito mais ganharia a polícia e a sociedade. Mas não posso culpar os policiais que estavam na caçada a homens que mataram colegas seus que estão sendo mortos como moscas.

Não posso culpá-los pela insegurança que eles próprios estão vivendo, colocando todos os dias suas vidas por uma sociedade que ainda não percebeu que o que está matando nossos policiais é o nosso silêncio! Essa de falta de garra, de sair ás ruas e exigir do Governo do Estado que forneça preparo e equipamento para nossos policiais, que abra concursos para suprir a carência de componentes em nossas forças policiais, esse nosso silêncio cínico e assustador, está permitindo a morte de pessoas como Fernando Guilherme e Luiz Hermes.

Da mesma forma, indago, como culpar os dois policiais militares do 9.º BPM de Rocha Miranda, o soldado Henrique e o cabo Fernandes, acusados de terem matado na segunda-feira, dia 26 de dezembro, dois jovens que chegavam de moto na favela do Acari? 

No entanto eles estão presos vez que foram acusados por moradores de Acari de terem assassinado os dois jovens que chegavam de moto à favela. O soldado Henrique, que de acordo com testemunhas seria o autor dos disparos, e o cabo Fernandes, foram autuados por homicídio doloso pelo delegado Paulo de Oliveira, da 39.ª DP (Pavuna), que se baseou em denúncias de moradores. O coronel Murilo Leite, comandante do 9.º BPM, disse que foi instaurado um Inquérito Policial Militar.

O coronel afirmou que levou a testemunha para a delegacia por que quer “a verdade” e que não está do lado de ninguém.

Os policiais se defendem e afirmam que os jovens estavam armados, dando escolta a um Gol branco com outros traficantes. Pode ser verdade? Pode! Tem tudo para ser verdade? Tem! Teriam agido em legítima defesa, já que foram encontradas e apreendidas armas nas mãos dos dois jovens, conforme afirmou o relações públicas da PMERJ, tenente-coronel Aristeu Leonardo. Mas também pode não ser, e as tais armas serem “velas”, que é um tipo de mascaração do local do crime quando se “planta” armas na mão do morto para aparentar a legítima defesa.

Mas se exercitarmos a imaginação, imaginemos o seguinte quadro: dois homens em uma moto entrando em uma favela. É de domínio público o conhecimento de que o tráfico monta sua guarda assim, em quase todas as favelas do Rio de Janeiro. Um toca a moto e o outro é o braço armado. De noite, ninguém vai “pagar para ver”.

Segundo o laudo do Instituto Médico Legal, o tiro entrou pelo lado direito da cabeça dos jovens, no rosto de um e no pescoço do outro. O laudo mostra ainda que o tiro foi disparado de um fuzil, provavelmente de calibre 7.62. 

Não. Não se pode culpar esses policiais nesse quadro de insanidade em que se encontra nossa política de (in)segurança pública. No máximo é legitima defesa putativa, situação na qual o agente imagina algo que se de fato estivesse ocorrendo legitimaria sua ação. Pensar que eram “soldados’ do tráfico é mais que plausível!

Culpo esse governo minúsculo, com sua política de segurança minúscula, que está deixando matar a população e os policiais que dela faz parte.

Não. Não se pode culpar esses policiais. Eu lamento pelos jovens se forem inocentes e lamento por seus pais e amigos. 

Mas se Fernando Guilherme e Luiz Hermes, os policiais civis assassinados da porta do fórum não “pagassem para ver”, poderiam estar entre nós.

Culpo sim, ao Governo do Estado do Rio de Janeiro pela morte de todos que me referi aqui. Mas no mesmo banco de réus, coloco-me e a toda a sociedade!

Nosso silêncio e omissão é a parte que nos cabe na barbárie.


http://paulodavida.blogspot.com/

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